A missão que lhe foi confiada não será simplesmente a de desencavar ossos e levá-los para longe. Ele já entendeu que será preciso lidar com os vivos tanto com os mortos.
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Sinopse:Paris, 1785.
Jean-Baptiste Baratte, um jovem engenheiro de origem modesta, recebe de um dos ministros do rei Luiz XVI uma missão desafiadora: livrar-se da igreja e do cemitério de Les Innocents. O cemitério vem acumulando corpos há séculos, chegando ao ponto da população vizinha sentir o gosto dos cadáveres na comida e na água. Respiram a morte, têm seu cheiro, seu hálito.
No começo, Barate vê nessa empreitada uma chance de limpar o fardo da história, a tarefa perfeita para um homem moderno, do futuro, da razão. Mas logo ele percebe que a igreja e o cemitério são prenúncios de uma queda maior que está por vir. Os rumores de uma grande mudança que se aproxima ganham volume, e o povo se divide quanto ao trabalho de Baratte: ao mesmo tempo que a cidade já não suporta mais um cemitério que não para de receber corpos e não tem para onde crescer, é difícil aceitar a mudança e tirar de cena um dos marcos do passado monárquico.
O engenheiro imagina que a missão seja ingrata, das mais desagradáveis, mas não faz ideia dos dramas e das calamidades que se avizinham e se concretizam conforme os ossos começam a emergir de seus séculos de descanso. E, com a agitação contra a corte de Luiz XVI se tornando cada vez mais insuportável, Baratte percebe que o futuro que planejara para si pode não ser mais o que ele quer de fato.
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Puro de Andrew Miller, é um romance histórico ambientado na Paris de 1785. O autor despe Paris de sua aura elegante e sensual, retratando uma cidade pútrida, onde o fedor dos mortos do cemitério Les Innocents empesteia o ar, o sabor dos alimentos, e até o hálito das pessoas que moram na região. Penicos sendo esvaziados nas calçadas, animais se aliviando nas ruas… um mar de podridão e excrementos. É de um realismo impressionante.O jovem engenheiro Baratte – protagonista da história – é um homem racional e progressista. Pensou que sua tarefa seria simples, mas acaba tendo que lidar com questões morais, sociais e com sua própria consciência. Baratte vê sua razão ser confrontada pela emoção.
O autor introduz drama, assassinato, estupro… o que trouxe mais tensão ao enredo. A escrita de Miller é espetacular – pois ele consegue ser poético sem ser rebuscado e descomplicado sem ser simplista.
A narrativa é repleta de metáforas. O título do livro, por exemplo, poderia ser considerado uma parábola, já que a atmosfera de Puro é originalmente suja. Ou talvez o autor simplesmente se refira à purificação de Paris com a destruição do cemitério Les Innocents. Quem sabe ao certo? É exatamente nessa questão que e a leitura se tornou truncada para mim. As metáforas e mensagens subentendidas me desgastaram com o tempo.
A trama é interessante, a narrativa bela, mas fiquei à margem da história. Achei que faltou um detalhamento melhor da sociedade pré-revolucionária. Temos um vislumbre, apenas isso, do despertar do povo para questões sociais e o início de pequenas manifestações.
Puro é um livro que desejo reler num outro momento, pois sinto que não consegui absorver tudo que o livro tem a oferecer. Puro agradará aos leitores que gostam de romances históricos descritivos, com uma prosa mais elegante e que não se incomodam com uma alta carga de humanidade. Sim, Puro descreve o ser humanos de uma forma muito intimista, e isso muitas vezes incomoda. Por mais que a morte permeie o livro do início ao fim, as páginas de Puro também estão repletas de vida.
Miller, Andrew. Puro. Bertrand, 2013. 378 p.